A flexibilidade do sistema elétrico está muito presente nas discussões sobre o futuro energético. Efectivamente, o impacto da produção das energias renováveis é frequentemente imprevisível. De mesmo, o consumo elétrico das novas innovações, como por exemplo os veículos elétricos, pode ter consequências desconhecidas sobre o sistema. E essas tecnologias vão avançar ainda mais no futuro.
Mas apesar da importância das grandes visões estratégicas à maneira de Tesla, Google e Uber, também vale a pena perguntar qual é a situação atual dos primeros projetos de flexibilidade. De fato, já existem primeros projetos de Resposta da Demanda, ajustando a procura à produção elétrica, sem precisar de blockchain ou de grandes innovações no armazenamento da energia elétrica.
Resposta da Demanda no Brasil
Tradicionalmente no Brasil, a energia hidráulica tem uma posição dominante. Esse tipo de energia já dispõe de um grau importante de flexibilidade intrínseca, visto que a água pode ser armenazada antes da produção elétrica. Isso também significa que os preços no mercado elétrico não estão incentivando a criação de novas capacidades de flexibilidade (veja por exemplo essa presentação da IEEE PES).
Todavia, a energia hidráulica também conhece limitações, seja no potencial de armazenamento de cada barragem, seja no potencial geográfico, ou ainda nos fatores ambientais e sociais que podem entravar a construção de novas barragens. Além disso, o consumo elétrico brasileiro não para de crescer. Assim, o Brasil começou a explorar a resposta de demanda, afim de ajustar a procura elétrica à produção.
Nesse contexto, o Brasil introduziu bandeiras tarifárias. Quando as
condições são menos favoráveis à produção elétrica, o preço vai subir. Há quatro níveis diferentes: a bandeira verde (= condições favoráveis, então acréscimo de tarifa de 0 R$), a bandeira
amarela (acréscimo de tarifa de 0.01 R$), a bandeira vermelha patamar 1 (acréscimo de tarifa de 0.03 R$) e por fim a bandeira vermelha patamar 2 (= condições
muito desfavoráveis, acréscimo de tarifa de 0.05 R$/kWh ou seja 0.01€/kWh). Para o mês de Dezembro 2017, a bandeira tarifária é a bandeira
vermelha patamar 1.
Outras medidas de Resposta da Demanda estão em discussão. Porém, hoje em dia, o sistema brasileiro ainda não chega a incentivar as reduções de consumo de
maneira direta. Quando as condições não estiverem favoráveis,
uma redução do consumo só pode impedir que o valor da conta do consumidor
aumente. O consumidor brasileiro ainda não pode ganhar dinheiro com uma redução
do consumo, mesmo que ela seja útil para o sistema elétrico.
Assim, vale a pena comparar o caso brasileiro com o da
Alemanha.
Na Alemanha, o progresso da energia solar e das turbinas eólicas
significa que uma parte importante da produção elétrica é relativamente imprevisível.
Assim, há situações de producão excessiva e otras situações de produção
insuficiente. No âmbito da sua estratégia energética, a Alemanha introduziu, em
2013, a Lei sobre os acordos de consumo interruptível (chamada "AbLaV").
Por conseguinte, os grandes consumidores elegíveis podiam pedir a participar
num programa remunerando a disponibilidade para uma redução de consumo. Quando
estiver realmente necessário reduzir o consumo, o participante deve ser pronto
para agir em somente alguns segundos (tipo 1: "interrupção imediata") ou em 15
minutos (tipo 2: "interrupção rápida"). A oferta mínima é uma
redução de 5 MW no consumo do participante.
Essa "lei AbLaV" suscitou muitos debates, a
oposição parlamentária achando que o dispositivo beneficia só os grandes
consumidores. Até a BNetzA, a agência reguladora alemã, repetiu nas suas análises
que os mercados já existentes da eletricidade seríam suficientes para
incentivar esse tipo de redução de consumo dos grandes indústrias… e isso a um
custo muito inferior ao custo da "lei AbLaV".
Todávia, o governo alemão já prolongou várias vezes
esta lei que inicialmente deveria ser só um projeto-piloto de 2013 a 2015. Na
versão atual, a “lei AbLaV” permanece em vigor até Julho 2022 pelo menos.
Mas visto que é um projeto com um tamanho limitado, o custo em 2017 era só de 0.006 ct€/kWh, (seja 0.00006 €/kWh ou em Reais 0.00023 R$/kWh), significando por ano 0.29 € (ou 1.13 R$) para uma família média. Isso é muito mais
barato do que quase todos otros programas energéticos da Alemanha, e então não há muita
polémica sobre a vontade do governo alemão de prolongar esse projeto-piloto.
Conclusão
O Brasil e a Alemanha começaram a explorar diferentes opções para aumentar a
flexibilidade do sistema elétrico. No Brasil, as medidas visam todos os
consumidores, enquanto que na Alemanha, visam só um grupo muito limitado. As duas
estratégias têm vantagens e desvantagens. Contudo, elas podem nos ajudar para
aprender mais sobre as opções de flexibilidade. É necessário continuar a pesquisa e o diálogo
entre os países e entre as diferentes estratégias.